Na noite de terça-feira, 27 de março, aconteceu a primeira
edição do ano do programa Cuidar é Básico. O convidado para falar sobre o tema “Entendendo
o funcionamento cerebral para estimular a aprendizagem do seu filho” foi o
neurologista André Palmini, que é chefe do Serviço de Neurologia do Hospital
São Lucas da PUCRS, diretor científico do Programa de Cirurgia da Epilepsia no
mesmo hospital, professor adjunto de Medicina da PUCRS e pesquisador do
Instituto do Cérebro do RS.
No Auditório 1, o especialista conversou com os cerca de 150
presentes sobre quatro tópicos: o desenvolvimento cerebral; as modificações que
acontecem no cérebro quando se aprende a ler; o papel das emoções no processo
de aprendizagem; e características da iGen – geração da internet.
Palmini afirmou que, apesar de já termos uma carga genética,
os estímulos externos atuam no desenvolvimento cerebral, ressaltando que é
possível moldar positivamente ou negativamente o cérebro, especialmente nos
primeiros anos de vida. Ao apresentar um gráfico da evolução da utilização de
glicose pelo cérebro, o neurologista explicou que o tempo todo os neurônios
estão formando conexões e que quanto mais ativa é essa função neuronal, mais o cérebro
precisa de glicose e de oxigênio. “Existe um progressivo aumento do consumo de
glicose, ou seja, da atividade metabólica cerebral, nos primeiros anos de vida,
chegando no pico por volta dos três ou quatro anos de idade e se mantendo nesse
nível ao longo da infância. Então esses são os momentos em que existe uma intensa
atividade cerebral, que pode ser moldada por aquilo que a gente oferece para a
criança”, explicou. Assim, Palmini afirmou que esse é um excelente período para
a aprendizagem de diferentes conceitos e comportamentos, e que as experiências
vividas nessa fase, sejam elas boas ou ruins, ficam marcadas por toda a vida.
Em seguida, o especialista falou sobre as modificações
cerebrais que acontecem quando uma criança aprende a ler, destacando que a leitura
é o grande diferencial dos seres humanos, uma vez que a linguagem nos diferencia
dos demais animais, mas é a leitura nos diferencia entre os humanos. Palmini
relatou que o homo sapiens existe há 20 mil anos, mas só passou a ler há cerca
de quatro mil. Isso aconteceu pela evolução cultural, porém, só foi possível
por já termos uma área em nosso cérebro formada geneticamente para esse tipo de
aprendizagem. “A gente nasce geneticamente programado para isso, mas a
qualidade do ensino dessa criança, o ambiente que ela vai estar, o aspecto
emocional envolvido com essa criança vai permitir que epigenéticamente essa
área se transforme na área de leitura”, explicou. Assim, estimular nas crianças
o prazer pela leitura, auxilia no desenvolvimento da capacidade cerebral de uma
área que ela utilizará durante toda a vida, para diferentes situações.
Para falar sobre a importância das emoções no processo de
aprendizagem, o neurologista explicou que as áreas do cérebro relacionadas com
a emoção não são exclusivas dos seres humanos e, portanto, estão sendo
desenvolvidas e aperfeiçoadas pela evolução há milhões de anos, já as áreas da cognição,
especificamente humanas, existem “apenas” há milhares de anos, e isso é levado
em conta na disputa entre razão e emoção. “A força da experiência sempre predomina
na natureza, e a experiência de áreas que estão sendo desenvolvidas há milhões
de anos predominam em relação a áreas muito mais jovens”, afirmou, explicando
que, por isso, as emoções da criança e as trocas emocionais que ela faz com os
professores, familiares e colegas afetam a aprendizagem. “Criar um ambiente
emocional adequado tende a aumentar a capacidade de que aquela informação fique
no cérebro da criança”, ressaltou.
Ao falar sobre a iGen (geração da internet), Palmini
destacou mudanças nos hábitos desses jovens em relação aos das gerações anteriores:
o risco aumentado de depressão e a tendência ao isolamento. “Do ponto de vista
médico, o mundo virtual veio facilitar muito a vida de crianças com dificuldades
sociais. Mas, a grande questão são as crianças que não tinham problema e que a
partir do excessivo uso de redes sociais e aparelhagem eletrônica desenvolvem
problemas”, afirmou o médico. A partir de um estudo comparativo de gerações,
Palmini mostrou que aparelhos como smartphones retardam a vontade de “ir
para o mundo”, aumentam a sensação de solidão, dificultam o sono, aumentam a
propensão à depressão. O especialista
explicou que os jovens saem menos hoje do que antes, mas que a superexposição
dos eventos sociais nas redes aumenta a sensação de rejeição de um adolescente que,
por exemplo, não foi convidado a uma festa que repercutiu por vários dias nas
redes sociais de seus colegas, e isso ativa no cérebro a mesma área relacionada
à dor física. Mais uma vez, o especialista destacou a combinação entre genética e experiências sociais, ressaltando que nem todos os adolescentes apresentarão
esse comportamento.
A orientação dada pelo especialista aos pais é fazer acordos
para o uso saudável dessas ferramentas: “Não tem como chegar e proibir o uso
dos aparelhos, mas é preciso comprar algumas brigas para limitar as horas que os adolescentes passam conectados
nas telinhas e nas redes sociais. A Academia Americana de Pediatria sugere que a
criança não tenha tablets e smartphones antes dos 12 anos e que o adolescente não
passe mais do que duas horas diárias conectado a esses aparelhos”, orientou.
Essa não foi a primeira vez que o neurologista esteve no
Colégio Farroupilha. Em 2017, Palmini foi um dos palestrantes do evento
Inteligência Coletiva (relembre aqui) e conversou com a equipe de comunicação da escola sobre novas conexões
cerebrais e aprendizagem (veja aqui alguns trechos da entrevista)